Quando estamos nos primeiros anos da escola, começamos a construir nossa percepção de mundo a partir do que aprendemos em sala de aula. Naturalmente, vamos tendo preferências por determinados assuntos ou disciplinas curriculares. Quem nunca ouviu:
– Ah! É que eu sou de humanas
– Já eu sou mais de exatas
Nos últimos anos escolares, naquele mapeamento de possibilidades para uma graduação, a gente sempre tende a considerar os cursos que oferecem pelo menos alguma correlação com nossas aptidões.
Quando falamos de criatividade de uma forma mais genérica, geralmente levamos o assunto a um consenso que só somos criativos quando gostamos de determinados temas, e que são esses gostos que nos oferecem o suporte necessário para o desenvolvimento criativo.
O estudo que trouxemos explica como a criatividade opera dentro da nossa mente.
Como nossa mente funciona?
Esqueçam aquela história de que criatividade é coisa só do lado direito do cérebro. Durante décadas, a cultura popular propagou essa ideia de que ser “dominado pelo lado direito” significava ser criativo e intuitivo, enquanto o “lado esquerdo” seria o da lógica e da análise. Mas a neurociência acaba de mostrar que essa divisão não existe.
Um estudo recente de neuroimagem, publicado no JAMA Network Open por pesquisadores da Harvard Medical School em 2025, botou um ponto final nessa equação. A real é que a criatividade não mora em um único lugar da cabeça, mas surge de várias regiões cerebrais trabalhando juntas. Essa descoberta atualiza o que a gente pensava sobre o pensamento criativo e impacta na educação, na criação e na resolução de problemas.
E a gente achando que a criatividade só servia para criar boas legendas para o Instagram.
Segundo Isaiah Kletenik e Michael D. Fox, autores do estudo, o objetivo era entender quais áreas do cérebro eram mais importantes para a criatividade e como lesões cerebrais poderiam afetá-la. E a conclusão é que comportamentos complexos como a criatividade não estão presos a uma região específica, mas se desenvolvem em circuitos cerebrais!
Agora uma curiosidade: de onde surgiu essa a teoria do “cérebro direito” ser o criativo?
A teoria bombou nos anos 60 e 70, quando pesquisadores notaram que danos em um lado do cérebro traziam dificuldades diferentes: o esquerdo afetava o lado analítico, enquanto o direito mexia com habilidades espaciais e artísticas.
A partir disso, simplificaram a compreensão, como se lógica fosse com o lado esquerdo e criatividade com o direito. Isso foi amplamente aceito em livros e testes de personalidade, mas a neurociência já comprovou que o cérebro não funciona assim, compartimentado. A criatividade acontece quando o cérebro todo se liga, misturando intuição, memória, resolução de problemas, emoções e pensamento abstrato.
E aqui vem um fato surpreendente: lesões cerebrais podem, às vezes, impulsionar a criatividade. O estudo de 2025, que analisou imagens cerebrais de quase 900 pessoas fazendo atividades criativas como desenhar, escrever e compor, mostrou que a criatividade vem de um circuito que pega o cérebro inteiro. Uma das descobertas mais interessantes é que danos no polo frontal direito do córtex pré-frontal — a área responsável por regular nossos pensamentos autocríticos — estavam frequentemente ligados a um aumento na produção criativa.
Lembrando que recentemente mostramos com a vergonha contribui impulsos criativos, leia aqui: Deixe de lado esse baixo-astral: estudo mostra como a vergonha pode impulsionar a criatividade. Nosso objetivo no Além da Influência é te ajudar!
Relaxar as funções executivas mais rígidas do córtex pré-frontal favorece um estado mental mais criativo, com associações livres e ideias inovadoras.
Quando essa área de “autovigilância” está menos ativa, os lobos frontais ficam mais “soltos”, deixando o cérebro criativo menos inibido e permitindo um pensamento mais livre e fora da caixa. Isso foi observado em casos como:
- Sobreviventes de AVC que, de repente, descobrem talentos artísticos.
- Pacientes com traumatismo craniano que mostram um aumento na criatividade divergente.
- Pessoas com demência frontotemporal (DFT) que, às vezes, têm um pico de expressão criativa.
Esses casos mostram que criatividade não é só ter ideias, mas também não ficar filtrando ou pensando demais nelas.
E como a gente pode liberar a criatividade?
Já que ela está ligada a um circuito cerebral distribuído, várias atividades podem acender essa chama. O portal Psychology Today listou três maneiras, que a gente adaptou para o nosso mundo de creators.
- Crie para ninguém: você pode argumentar o que quiser, mas a gente sabe que você cria pensando também com a expectativa do público. Como todo processo comunicacional, buscamos sempre sermos entendidos. A proposta, neste caso, é criar sem nenhum filtro ou parâmetro. Essa dica o próprio Rick Rubin recomendou no seu best-seller. Rabisque, escreva, pinte, grave vídeos, a única regra é não utilizar regras que limitem sua liberdade criativa.
- Movimente-se: se a gente recomendar atividade física, vamos reproduzir um clichê muito necessário. Para além do benefício direto e esperado, as atividades físicas, especialmente exercícios aeróbicos como corrida ou dança, ativam diversas regiões cerebrais e aumentam a flexibilidade cognitiva.
- Experimente o mindfulness: quando foi a última vez que você fez uma apenas um tarefa por vez? A gente criou e agora, reproduz uma ideia que precisa malhar ouvindo podcast, lavar a louça vendo video-aula, mil abas abertas no navegador enquanto responde mensagens do WhatsApp. A proposta é inverter essa lógica. Se concentrar em apenas um objetivo, reduzindo o excesso de pensamento, diminui as probabilidades de esgotamento mental e permite fluxo de pensamento mais criativo.
Para amarrar toda essa história
A criatividade nunca foi compreendida como um categoria de habilidade limitada a criar produtos de fruição, ela está ligada primeiramente com a solução de problemas. E não importa se você é de humanas ou de exatas.
Na próxima vez que você se sentir bloqueado, lembre-se que a criatividade não tá presa em um cantinho do cérebro. Fazer atividades que engajem o cérebro todo, trabalhando percepção ou a lógica vão contribuir com a nossa criatividade. Contudo, continuamos com nossa dica: inverta um pouco a rotina de suas criações, a expansão de possibilidades ainda é o melhor maneira de desenvolver a criatividade.