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Em meio a tantas mudanças, até quando vamos depender exclusivamente das redes sociais?

Sumário

— Acorda! Acorda!

— O que foi? Por que tanto alvoroço?

— Estamos perdidos

— Tá maluco essas horas? Vou aproveitar que você já me acordou pra me adiantar pro trabalho, só vou ver aqui…

— É isso que eu tava falando. Viu?

— Cadê todo mundo?

— Não sei, acordei pra ir ao banheiro, peguei meu celular, estranhei que não tinha nenhuma notificação, quando fui abrir o aplicativo, tudo sumiu.

— E agora?

— A gente tá isolado. Não tem como trabalhar, conversar, acabou, acabou.

— Me sinto como no filme do Náufrago…

— É pior, pois não dá nem pra postar…

E se você acordasse em um mundo que não há nenhuma rede social, o que isso mudaria na sua rotina?

Acredito que, no mínimo, você teria que reorganizar todas tarefas corriqueiras. Até porque dificilmente conhecemos alguém que tenha uma vida descolada das redes – e tudo passa por ela. No fim das contas, é um sistema já incorporado no jeito que nos apresentamos à sociedade. Posto, logo existo!

Agora em um recorte mais definido. O que mudaria na sua vida como creator?

Pensa aí, não tem problema. Essa pergunta é reflexiva e não retórica.

Tentando traçar um paralelo com que eu percebo cotidianamente, suponho que você, ao responder essas perguntas, tenha projetado uma rotina mais “analógica”, um lifestyle “back to the 90’s”. Com atividades de lazer e trabalho que se conectam com práticas mais antigas da vida.

Aqui há um ponto importante. A pergunta inicial não foi sobre a internet, apenas sobre as redes sociais. Ou seja, não foi extinguidas formas de interação, compartilhamento, criação de conteúdo, distribuído. Apenas excluímos as plataformas que agrupam essas atividades e as coordenam através de algoritmos

– Mas por que devo me preocupar tanto com isso?

Da metade do ano passado para cá, tivemos embates entre a forma de operação das empresas que comandam redes sociais e governos locais. Que nos interessa, os mais notáveis casos foram:

  • a suspensão temporária do X (antigo twitter) no Brasil
  • a “quase” suspensão do TikTok que pressiona para uma possível venda a alguma empresa estadunidense ou a um aliado político de Trump.

Além disso, a Meta (detentora do WhatsApp, Instagram, Threads e Facebook), através do seu dono Mark Zuckerberg, já demonstrou apoio público ao governo Trump e aos interesses dos Estados Unidos.

Esse marco, tanto estratégico quanto político, gerou ótimas reflexões, principalmente no LinkedIn:

Vamos ver o que alguns dos nossos especialistas em comunicação escreveram:

Erih Carneiro, fundador da Gombo, falou da retirada da moderação pelo Zuckerberg:

Para ler o texto completo, clique aqui.

“Posso falar? Vem chumbo grosso por aí, e quero pontuar algumas questões que o anuncio deixa a entender:

1 – A big tech parece estar disposta a enfrentar Governos e Justiça, com destaque Brasil, Austrália e União Europeia, que estão colocando barreiras à atividade das bigtechs.

2 – Esta decisão é um claro alinhamento ao Governo Trump, que é a favor da liberdade expressão, mas nem tanto, a gente bem sabe disso.”

Nosso Gomber, Guga Peccicacco, também conhecido como The PR Guy falou da relação da empresa Meta com a democracia:

Para ler o texto completo, clique aqui.

“Depois de assistir ao vídeo de Marck Zuckerberg umas 10x, essas são minhas primeiras conclusões.

➡️ Mover a moderação do Meta para a comunidade pode facilmente apoiar a ideia de que, quando ocorre um erro, a comunidade é a culpada por não denunciar em tempo hábil.

➡️ Trabalhar com o governo dos EUA para pressionar outras nações a reduzir a legislação sobre moderação de conteúdo nas mídias sociais sugere uma abertura futura para manipulação de eleições, por meio de hashtag#fakenews.”

Rodrigo Scapolatempore desdobrou a reflexão do Guga ampliando para Jornalismo, informação e democracia:

Para ler o texto completo, clique aqui.

“>> Quais as principais confusões de conceito que já estão plantando na sua cabeça?

– Misturar liberdade de expressão com terreno propício e sem limites para propagar desinformação de forma confortável e a favor de pleitos políticos.

– Fingir que a ideia é tornar a checagem mais democrática, “feita por todos” e não dependente de curadorias ‘parciais’ e com interesses vinculadas à mídia.

– Relativizar a palavra OPINIÃO, tornando ela sinônimo de: posso dizer tudo, inclusive te ofender e afrontar minorias com meu (permitido) discurso de ódio.”

Dado todos esses pontos, proponho uma reflexão sobre nossa dependência com essas redes

Quando o X foi suspenso no Brasil, os usuários da rede seguiram três caminhos (fora o uso de VPN):

  1. migraram para o Bluesky;
  2. migraram para o Threads;
  3. esperar o X voltar a funcionar.

Quando o X voltou, essas duas redes que receberam muitos usuários, perderam-nos. Por que isso? Porque as pessoas vão para onde as pessoas estão.

Me permita mais uma vez retomar a filosofia da fila. Se há dois carrinhos de pipoca, um deles com 30 pessoas na fila e o outro sem ninguém na espera, é provável que pré-julguemos que o carrinho com fila seja muito melhor que o outro.

Você já deve ter visto algum vídeo em que as pessoas utilizam algum experimento coercitivo. Por exemplo: todos entram no elevador e colocam um capacete, aí a pessoa que está sendo analisada no experimento também coloca, mesmo sem saber o porquê.

Por mais que haja muito material sobre isso e até podemos trazer isso em outros textos, não é nosso objetivo refletir sobre como neuralmente interagimos com as redes.

O ponto é mais prático: criamos conteúdos para as redes e alimentamos seus algoritmos mesmo discordando dos seus critérios de rankeamento. Tudo porque todos fazem isso e ninguém de nós quer ficar de fora.

Poderíamos criar um site wordpress, pagar um domínio próprio e indexar nossos textos, vídeos, posts, carrosséis lá. Inclusive, com muito menos limitações. Mas quem consumiria?

Em um primeiro momento, já identificamos que há uma interdependência da nossa própria interação como comunidade que nos faz refém das redes. Interagimos como peixes emaranhados em uma rede. Nesse caso, ninguém quer ser peixe fora da rede.

Tem aquele famoso ditado, se é de graça, é porque o produto é você. As redes sociais funcionam assim: oferecem uma série de recursos em troca dos nossos dados. Tratando assim parece algo muito grave, né? Será que a solução é deletar nossas redes?

Calma, as coisas não precisam ser decididas assim.

Minha última leitura de 2024 foi “Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais”, do cientista da computação Jaron Lanier. Spoiler: concordo com todos seus argumentos, mas ainda não deletei minhas redes.

Esse assunto é complexo. Pense, Lanier ofereceu 10 argumentos que só poderiam ser explicados em um livro – posso trazer uma resenha no futuro. Então, nem é minha pretensão encontrar uma solução para isso – peço perdão por frustrar vocês.

Como seria o mundo perfeito

No mundo perfeito todos nós teríamos total controle sobre o conteúdo, publicaríamos em sites próprios, formatos próprios e tomando como orientação apenas o feedback sincero e direto do público, sem mediações por algoritmos que não temos controle, nem conhecimento do seu comportamento.

Por que é importante idealizar?

Porque entendemos qual é o nosso norte, a nossa crítica e o que devemos observar. Na física se estuda os gases perfeitos, na prática, o comportamento deles não se dá de forma ordenada. Para efeito de compreensão, é necessário isolar algumas variáveis e estabelecer alguns comportamentos. É questão de objetivo. Na filosofia, poderíamos chamar de método heurístico.

Voltando a realidade dos boletos e das dores nas costas, onde acredito que a rede social (como conceito) não vá acabar, sempre haverá o fantasma da obsolescência #sddsorkut. Isso já ocorre quanto aos formatos. Uma hora é texto, uma hora é vídeo, outra hora é vídeo vertical legendado com três segundos de duração.

E se a rede social que você gera conteúdo ficar obsoleta ou praticar alguma política que te afete negativamente, o que você vai fazer?

– Vai me dizer que você não ficou surpreso com o pronunciamento do Zuckerberg?

Imagine a perda dos conteúdos indexados lá, a perda dos consumidores, das relações. Por mais que haja migração, é sempre um começo.

Falamos muito sobre a expansão vertical dos conteúdos, ou seja, se aperfeiçoar em um formato para se destacar, mas será que isso também vale para as redes sociais? Será que vale dedicar anos e anos sucessivamente gerando conteúdo apenas para uma rede ou para um conjunto de redes que adotam políticas coordenadas? Esse é o ponto de reflexão. Estamos diante de uma mudança de paradigma.

Da mesma forma que falamos que é importante procurar públicos mais segmentados, pois estes têm mais chance de se converter em um consumidor, fã ou lead, sugiro que a gente abra caminhos para plataformas sociais também segmentadas. Dentro desse espectro, talvez a que mais se destaque nesse momento é o Substack. Lá (ou aqui) é um local de construção de conhecimento, distribuição de conteúdos mais aprofundado e autorais, com menos perseguição do que é “bom pro algoritmo”.

Comentário anti-crítica: não, o Substack não é a plataforma neutra, perfeita, objetiva, pois esta plataforma só existe no mundo das ideias. Ainda assim, por distribuir o conteúdo diretamente, ou seja, quem assina, recebe, o Substack possibilita que a gente construa uma audiência mais qualificada. Contudo, tomem isso apenas como um exemplo de caminho a ser seguido. O Substack não está patrocinando este texto – ainda que pudesse.

Reféns do algoritmo

O que me faz convocar creators e usuários para ampliar a discussão, testar novas formas de distribuição e questionar a forma de operação das redes sociais é identificar essa necessidade, quase obsessiva, de atender aos requisitos dos algoritmos. Não recomendo ser do contra por birra. Só não precisamos aceitar passivamente todas imposições que essas grandes bigtechs implementam.

Há 15 anos atrás, criadores de conteúdo combinavam vídeos, blogs próprios, redes sociais (de forma menos intensa). Também sei que a creator economy era consideravelmente menor – na verdade, nem existia o termo creator economy.

Mas com tanto dinheiro rolando em marketing de influência, venda direta de produtos e serviços, vamos deixar que redes sociais que atendem em primeiro, segundo e terceiro plano seus próprios interesses sejam os mediadores entre creator e público?

Estamos diante de um oligopólio digital. Para muitos, as redes sociais são a própria internet.

Pra fechar

Sabe esse texto que você está lendo, sim, ele será distribuído em redes sociais, terá sua métricas analisadas e dados coletados pelo algoritmo. Esse é um convite para reflexão. A gente foca muito em como dominar as redes e pensa pouco em meio de não depender exclusivamente delas.

Sei que saímos sem respostas, mas pelo menos com algumas perguntas mais direcionadas e que não foram recomendadas pelo algoritmo.

p.s: tudo isso e nem colocamos as IAs no meio. Isso ficará para as próximas

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